O Futuro do Trabalho e o Impacto no Imobiliário Comercial

Introdução

O mundo do trabalho está a mudar de forma estrutural.

A pandemia de 2020 acelerou transformações que já se vinham a desenhar: o modelo híbrido de trabalho, a digitalização das empresas, a preocupação com o bem-estar dos colaboradores e, mais recentemente, a pressão para a sustentabilidade. Estas mudanças estão a reconfigurar a procura por espaços comerciais e a transformar profundamente o mercado imobiliário de escritórios.

O setor enfrenta hoje uma encruzilhada: enquanto os ativos mais obsoletos perdem valor e enfrentam taxas de vacância crescentes, os edifícios modernos, tecnologicamente avançados e sustentáveis são cada vez mais disputados e valorizados.

Neste artigo analisamos como o futuro do trabalho está a impactar o imobiliário comercial, quais as tendências que se desenham para 2025 e de que forma os investidores e promotores podem preparar-se para esta nova realidade.

Como o Futuro do Trabalho Redefine o Imobiliário Comercial

A adoção massiva do trabalho híbrido — alternando dias em casa e no escritório — mudou a forma como as empresas pensam os seus espaços.

Deixou de fazer sentido ter grandes áreas de escritórios com centenas de postos fixos. As novas necessidades passam por:

  • Espaços colaborativos e flexíveis
  • Salas de criatividade e inovação
  • Menos metros quadrados por trabalhador
  • Melhor localização e acessibilidade

 

Além disso, o conceito de qualidade de vida no trabalho ganhou peso. O ambiente do escritório deixou de ser apenas um espaço físico: é uma ferramenta de atração e retenção de talento.

Empresas procuram edifícios que proporcionem bem-estar, luz natural, boas condições acústicas, espaços verdes, certificações de sustentabilidade (como a WELL ou LEED) e uma forte integração tecnológica.

Em consequência, os escritórios tradicionais de open space massificado, em localizações secundárias e sem certificações ambientais estão a perder competitividade.

O Novo Perfil da Procura e a Seleção de Espaços

Os dados recentes da Savills, referentes ao primeiro trimestre de 2025, confirmam estas tendências:

  • A taxa de ocupação de escritórios aumentou 8% no último ano — a primeira inversão consistente desde o início do ciclo de pandemia.
  • A renda dos edifícios prime estão em crescimento, impulsionadas pela forte procura por ativos de qualidade e sustentáveis.

 

As empresas, ao renegociar ou procurar novos espaços, priorizam edifícios que ofereçam:

  • Certificação energética A ou superior
  • Certificações ambientais como LEED, BREEAM ou WELL
  • Localização próxima de transportes públicos e zonas vibrantes
  • Flexibilidade na ocupação (espaços adaptáveis)

 

Já não basta ter um escritório em zona central; é fundamental que o imóvel responda às exigências de ESG (Environmental, Social and Governance) e proporcione uma experiência de utilização diferenciadora.

 

Este fenómeno está a provocar a chamada “fuga para a qualidade” (flight to quality):

  • Empresas aceitam pagar rendas mais elevadas por espaços melhores;
  • Imóveis obsoletos enfrentam maiores dificuldades de ocupação e desvalorização.

 

Especialmente no segmento de grandes empresas e multinacionais, a certificação de edifícios já não é um extra — é uma condição base.

Impacto nas Avaliações e no Investimento Imobiliário

As mudanças na procura estão a refletir-se diretamente nos valores de mercado.

De acordo com a análise da Savills (Q1 2025):

  • O volume de investimento em escritórios aumentou 28% em termos homólogos no início deste ano,
  • No entanto, ainda está 45% abaixo da média dos últimos cinco anos — o que demonstra que o mercado está seletivo e cauteloso.

 

As principais tendências observadas são:

  • Compressão das yields prevista para ativos prime — estima-se uma redução de 25 pontos base até final de 2025 nos melhores mercados europeus, incluindo Lisboa;
  • Aumento de transações no segmento entre 30 e 100 milhões de euros — ativos de dimensão média a alta, mas com qualidade reconhecida;
  • Maior peso de investidores locais e regionais — enquanto os investidores internacionais regressam de forma gradual.

 

Importante:

  • Edifícios com boas localizações e certificações estão a manter ou aumentar o seu valor;
  • Imóveis não adaptados estão a sofrer desvalorizações acentuadas.

 

Este é um fenómeno que não se limita às capitais financeiras como Paris ou Londres.

Em mercados como Lisboa e Porto, verifica-se a mesma lógica:

os edifícios recentes, sustentáveis e adaptados ao novo perfil de trabalho são absorvidos rapidamente, enquanto ativos antigos, mesmo que bem localizados, ficam para trás se não forem reabilitados.

 

Valorização do green premium:

O valor dos edifícios com certificações sustentáveis já supera em alguns mercados europeus os 20%-30% em comparação com imóveis tradicionais.

Esta tendência tende a reforçar-se nos próximos anos, à medida que as exigências ambientais e sociais se intensificam.

Principais Tendências

As dinâmicas observadas apontam para uma transformação estrutural do mercado de escritórios, que tenderá a consolidar-se nos próximos anos:

 

Redução de Yields nos Ativos Prime

O aumento da procura por edifícios modernos e sustentáveis está a pressionar os valores dos ativos premium.

A compressão prevista das yields em 25 bps até final de 2025, segundo a Savills, confirma que os investidores estão dispostos a aceitar rendibilidades mais baixas em troca de menor risco e maior liquidez futura.

 

Crescimento da Atividade de Investidores Locais e Europeus

Com a melhoria das condições de financiamento (previsão de taxas de juro ECB a 2% até meados de 2025) e maior estabilidade económica, investidores regionais estão a ganhar protagonismo, ocupando o espaço que os grandes fundos internacionais demoraram a recuperar.

 

ESG como Novo Standard de Mercado

As exigências ambientais, sociais e de governança deixaram de ser apenas uma vantagem competitiva: passam a ser mandatórias para preservar e valorizar os ativos.

Edifícios sem certificação, com baixa eficiência energética ou inadequados para novos modelos de trabalho enfrentarão maiores taxas de vacância e desvalorizações aceleradas.

 

Reabilitação como Alternativa Estratégica

Com terrenos escassos e construção nova cara, a reabilitação de ativos existentes para padrões ESG e flexibilidade será uma das principais oportunidades de criação de valor.

A Centralidade Redefinida

Zonas emergentes com boa acessibilidade, qualidade urbana e espaços adaptáveis ganham peso face às localizações tradicionais saturadas.

O conceito de Prime CBD expande-se para incluir novas centralidades urbanas ligadas à qualidade de vida e sustentabilidade.

Conclusão

O futuro do trabalho não é apenas uma tendência: é uma força que está a reconfigurar o mercado imobiliário comercial de forma estrutural.

Os espaços de escritórios evoluem de simples locais de trabalho para verdadeiras plataformas de bem-estar, colaboração e inovação.

A eficiência energética, a flexibilidade, a certificação ambiental e a integração tecnológica são hoje fatores críticos de sucesso.

Quem investir ou promover edifícios adaptáveis, sustentáveis e orientados para as novas exigências terá uma vantagem clara num mercado cada vez mais seletivo.

Por outro lado, quem não acompanhar esta transformação arrisca-se a enfrentar desvalorizações e dificuldades crescentes na ocupação dos seus ativos.

O desafio para promotores, investidores e gestores é claro:

reimaginar o conceito de espaço de trabalho e antecipar o que as empresas e os seus colaboradores realmente valorizam.

Adaptar-se não é opcional — é a única estratégia para preservar e criar valor no novo ciclo do imobiliário comercial.

Partilhar Artigo

Este site está protegido por reCAPTCHA e aplica-se a Política de Privacidade e os Termos de Serviço da Google.

Mantenha-se a par
subscreva a
nossa newsletter.

plugins premium WordPress