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Por que a Sustentabilidade no Imobiliário É Imperativa

1. Introdução

A sustentabilidade tem vindo a tornar-se um dos pilares fundamentais no setor imobiliário, devido às crescentes preocupações relacionadas com as alterações climáticas, a eficiência energética e a responsabilidade social das empresas. Neste sentido, a integração de boas práticas de sustentabilidade, em todas as fases do ciclo de vida dos ativos imobiliários (desde a conceção do projeto até à manutenção), não só promove uma menor pegada ambiental, como também pode gerar valor económico e social acrescido.   De acordo com a Comissão Europeia, o setor da construção e do imobiliário é responsável por cerca de 40% do consumo de energia e 36% das emissões de gases com efeito de estufa na União Europeia (EU). Em Portugal, dados do INE (Instituto Nacional de Estatística) e de relatórios do APA (Agência Portuguesa do Ambiente) confirmam a relevância destes números, evidenciando a necessidade de implementar práticas e soluções que reduzam o impacto ambiental associado à edificação e ao uso dos imóveis.   Este artigo pretende explorar as melhores práticas de sustentabilidade no setor imobiliário, com especial destaque para estratégias de construção sustentável, eficiência energética, certificações ambientais e modelos de negócio que colocam a sustentabilidade no centro da sua proposta de valor. Serão ainda abordadas as vantagens que a adoção de tais práticas pode trazer para promotores, investidores, mediadores e utilizadores finais, reforçando o papel central do setor imobiliário na transição para uma economia mais verde e inclusiva.  

2. Conceitos Fundamentais de Sustentabilidade no Imobiliário

Antes de abordarmos as melhores práticas, importa clarificar alguns conceitos-chave:

  1. Sustentabilidade

De acordo com a definição clássica das Nações Unidas (Relatório Brundtland, 1987), o desenvolvimento sustentável procura responder às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades. No contexto imobiliário, isto implica a utilização racional de recursos, minimizando o impacto ambiental e promovendo a coesão social.

  1. ESG (Environmental, Social, Governance)

Cada vez mais, investidores e stakeholders avaliam o desempenho das empresas e dos ativos não apenas pela vertente financeira, mas também pelos critérios Ambientais (Environmental), Sociais (Social) e de Governação (Governance). No imobiliário, o ESG reflete-se na eficiência energética e ambiental, na inclusão social (por exemplo, acessibilidade e habitação para todos) e na transparência dos processos de gestão e liderança.

  1. Eficiência Energética

Consiste na redução do consumo de energia para um determinado nível de serviço ou conforto. No imobiliário, a eficiência pode ser alcançada através de elementos construtivos (isolamentos, janelas de elevado desempenho, uso de energias renováveis, etc.) e de sistemas de gestão inteligente (climatização, iluminação, dispositivos IoT – Internet das Coisas).

  1. Economia Circular

Conforme promovido pela Comissão Europeia no seu Plano de Ação para a Economia Circular, a ideia passa por reduzir o desperdício de materiais ao mínimo, prolongando o ciclo de vida dos produtos. Na construção, tal significa reutilizar materiais, priorizar processos construtivos “secos” (industrialização, pré-fabricação) e fomentar a reciclagem de resíduos.

3. Estratégias de Construção Sustentável

Um dos aspetos centrais das melhores práticas de sustentabilidade no setor imobiliário passa pela forma como se planeia, projeta e constrói. Neste campo, ganham relevância conceitos como a construção sustentável, a bioarquitetura e o design passivo:
  1. Escolha de Materiais Ecológicos
    • Materiais de baixo impacto ambiental: Madeira proveniente de florestas certificadas (FSC ou PEFC), tijolos ecológicos, tijolos de solocimento, palha, cortiça ou outros materiais com reduzida pegada de carbono.
    • Materiais reciclados e recicláveis: Reincorporação de plásticos, aço ou alumínio reciclado para reduzir o consumo de matérias-primas virgens.
    • Materiais de origem local: Diminuir a pegada de transporte e valorizar a economia regional.
  2. Desenho Passivo e Bioclimático
    • Orientação do edifício: Maximizar a exposição solar para aquecimento natural nos meses frios e prever elementos de sombreamento nas estações quentes.
    • Ventilação natural: Projetar aberturas e pátios internos que facilitem a circulação do ar, reduzindo a necessidade de climatização artificial.
    • Isolamento térmico: Investir em paredes e coberturas com elevado desempenho térmico, permitindo poupança energética significativa.
  3. Eficiência Hídrica
    • Recolha e reutilização de águas pluviais: Adotar sistemas que permitam armazenar a água da chuva para uso em regas de jardins ou descargas sanitárias.
    • Dispositivos de baixo consumo: Instalar torneiras, chuveiros e autoclismos eficientes, reduzindo o desperdício.
    • Paisagismo sustentável: Escolha de espécies autóctones que exijam pouca irrigação, contribuindo para a redução do consumo de água.
  4. Redução e Gestão de Resíduos de Construção
    • Planeamento construtivo que limite desperdícios durante a obra.
    • Triagem e encaminhamento de resíduos para reciclagem ou reaproveitamento, em conformidade com as orientações da Agência Portuguesa do Ambiente (APA).
    • Uso de elementos pré-fabricados que minimizam erros e reduzem excedentes de material.

4. Eficiência Energética em Edifícios

A Diretiva Europeia relativa ao Desempenho Energético dos Edifícios (EPBD), transposta para a legislação portuguesa através do Decreto-Lei n.º 101-D/2020, estabelece metas ambiciosas para melhorar a eficiência energética e reduzir as emissões de carbono no setor dos edifícios. Estas metas exigem que cada Estado-Membro, Portugal incluído, implemente políticas e incentivos que promovam:
  1. Certificação Energética
  2. Em Portugal, a ADENE (Agência para a Energia) é a entidade responsável pela Certificação Energética dos Edifícios. As classes variam de A+ (melhor desempenho) até F (pior desempenho). Um imóvel com boa classificação energética usufrui de maior conforto térmico, menores custos de consumo e, em muitos casos, maior valor de mercado.
  3. Sistemas de Climatização Eficientes
    • Bombas de calor ou aerotermia para aquecimento e arrefecimento, em detrimento de equipamentos com baixos rendimentos.
    • Painéis solares térmicos para aquecimento de águas sanitárias.
    • Sistemas de ventilação mecânica controlada (VMC) para manter uma boa qualidade do ar interior.
  4. Iluminação LED e Automatismos
    • Luminárias eficientes (LEDs ou lâmpadas fluorescentes), associadas a sensores de presença e controlo de intensidade para otimizar consumos.
    • Building Management Systems (BMS) para gerir automaticamente iluminação, climatização e segurança, ajustando recursos consoante a ocupação e as necessidades reais.
  5. Uso de Energias Renováveis
    • Painéis fotovoltaicos para produção de eletricidade limpa, reduzindo a dependência da rede e os custos energéticos.
    • Microgeração e autoconsumo: Possibilidade de injetar excedentes na rede ou partilhar energia com a vizinhança, conforme regulamentado em Portugal.

5. Certificações Ambientais e de Sustentabilidade

Para além da Certificação Energética obrigatória, existem sistemas de certificação voluntários que avaliam de forma integrada vários indicadores de sustentabilidade:

  1. LEED (Leadership in Energy and Environmental Design)

Criado pelo U.S. Green Building Council, avalia edifícios quanto à eficiência hídrica, energia, materiais e qualidade ambiental interior. Com várias categorias (Certified, Silver, Gold, Platinum), o LEED é reconhecido a nível internacional.

  1. BREEAM (Building Research Establishment Environmental Assessment Method)

Desenvolvido no Reino Unido, analisa o desempenho de edifícios em termos de gestão, saúde, bem-estar, energia, água, utilização do solo, materiais, resíduos, ecologia e poluição. É um dos sistemas mais antigos e disseminados na Europa.

  1. WELL Building Standard

Foca-se principalmente na saúde e bem-estar dos ocupantes, analisando fatores como a qualidade do ar, água, alimentação, luz, conforto térmico e impacto psicológico do espaço.

  1. Passivhaus

Certificação de origem alemã que se dedica ao design passivo extremo, promovendo edifícios com necessidades energéticas muito próximas de zero, graças a um elevadíssimo isolamento e a um controlo rigoroso da ventilação.

A escolha de uma destas certificações, ou de várias em conjunto, depende dos objetivos do promotor, da tipologia do projeto e do mercado-alvo. Ainda que possa haver um investimento inicial adicional, a longo prazo há ganhos na redução de consumos e na valorização do ativo, além de um posicionamento responsável diante de clientes e investidores.

6. Modelos de Negócio Sustentáveis e Responsabilidade Social

Além de se focar nos aspetos técnicos da construção e da gestão de edifícios, a sustentabilidade no imobiliário abrange também a esfera empresarial e social:
  1. Promoção de Habitação Acessível
Tanto a Comissão Europeia como o ONU-Habitat sublinham a importância de garantir habitação digna e financeiramente suportável para todos. Em Portugal, vários programas públicos e parcerias público-privadas promovem habitações de renda acessível. Para as empresas do setor, participar nestes projetos pode ser benéfico a nível de imagem e alinhar-se com princípios de responsabilidade social e ESG.
  1. Investimento Socialmente Responsável (ISR)
Os fundos de investimento estão cada vez mais atentos ao desempenho ESG, não apenas pelo impacto ambiental, mas também pela estabilidade de rendimentos a longo prazo. A aposta em edifícios verdes, eficiência energética e habitats resilientes a riscos climáticos pode reduzir custos operacionais e valorizar o portefólio.
  1. Reabilitação Urbana e Economia Circular
Os centros históricos das cidades portuguesas contêm um enorme potencial de reabilitação (tanto residencial como comercial), e a regeneração urbana pode conciliar princípios de economia circular, aproveitando estruturas já existentes e evitando a expansão urbana desnecessária. Medidas de incentivo fiscal para reabilitação e melhoria energética (por exemplo, redução do IMT ou do IMI por um certo período) são práticas já implementadas em diversos municípios, alinhadas com as diretivas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
  1. Transparência e Envolvimento Comunitário
A sustentabilidade também tem um lado social que passa pela participação dos moradores e das comunidades no desenvolvimento de projetos, fomentando uma relação de proximidade e confiança. Práticas de urbanismo participativo e iniciativas de bairro (jardins comunitários, equipas de manutenção voluntárias, etc.) fortalecem o capital social local, resultando em maior coesão e menor conflitualidade.

7. Benefícios da Sustentabilidade para o Mercado e para os Intervenientes

A adoção de melhores práticas de sustentabilidade no imobiliário tende a trazer vantagens significativas para todos os agentes envolvidos:
  1. Redução de Custos Operacionais
    • Imóveis energeticamente eficientes, com equipamentos de baixo consumo e boa capacidade de isolamento, reduzem as contas de eletricidade, água e manutenção.
    • Estas poupanças podem ser especialmente apelativas em edifícios de escritórios e espaços comerciais, onde os consumos são elevados.
  2. Valorização do Ativo
    • Os investidores e compradores estão cada vez mais dispostos a pagar um prémio por imóveis certificados ou reconhecidos por boas práticas sustentáveis, na expectativa de menor risco e maior estabilidade de valor futuro.
    • Conforme relatórios do mercado internacional (por exemplo, dados da RICS e do European Public Real Estate Association (EPRA)), edifícios sustentáveis tendem a apresentar taxas de ocupação mais elevadas e valores de arrendamento superiores.
  3. Mitigação de Riscos
    • O imobiliário sustentável está mais preparado para lidar com futuros riscos regulamentares (exigências de descarbonização, metas de emissões zero) e com uma possível subida do preço da energia.
    • Um stock imobiliário resiliente oferece maior garantia de liquidez em cenários de crise, pois mantém-se atraente para utilizadores e investidores.
  4. Reforço da Imagem e da Reputação
    • Promotores, construtoras, mediadoras e gestores de ativos que integrem práticas de sustentabilidade são melhor vistos pelo público, pela concorrência e pelas entidades reguladoras.
    • À medida que as preocupações ambientais se tornam mais urgentes, empresas que ignorem estas questões podem enfrentar críticas e perder competitividade.
  5. Contribuição para Objetivos Internacionais
    • Alinhamento com as metas definidas no Acordo de Paris (UNFCCC) e nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas.
    • Participação ativa na transição verde defendida pela Estratégia de Crescimento da UE, o European Green Deal, fomentando um ambiente regulatório favorável e acesso a possíveis linhas de financiamento e incentivos.

8. Desafios na Implementação

Apesar de todas as vantagens, a adoção de práticas de sustentabilidade no imobiliário enfrenta alguns desafios:
  1. Custo Inicial
    • Muitas soluções sustentáveis acarretam um custo inicial superior (instalação de painéis solares, sistemas de bombagem de calor, vidros de alta eficiência, etc.). Em contrapartida, o retorno a médio/longo prazo costuma ser favorável, mas alguns promotores e investidores continuam a privilegiar soluções de menor custo imediato.
    • Instrumentos de financiamento verde, como os “green bonds” ou linhas de crédito específicas disponibilizadas por alguns bancos, podem ajudar a ultrapassar esta barreira.
  2. Conhecimento Técnico
    • Requer profissionais qualificados (arquitetos, engenheiros, auditores energéticos) e mão de obra especializada.
    • É essencial a formação contínua e a partilha de boas práticas nos vários intervenientes da cadeia de valor da construção e mediação imobiliária.
  3. Regulamentação Dispersa
    • Embora existam orientações europeias e nacionais, as regras de licenciamento, incentivos fiscais e certificações podem variar consoante o município.
    • A Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e a própria legislação autárquica devem convergir para simplificar processos e clarificar normas.
  4. Sensibilização dos Utilizadores
    • Embora haja uma maior consciencialização ambiental, nem todos os consumidores compreendem o valor real de soluções sustentáveis a longo prazo.
    • Campanhas de informação e educação podem demonstrar as vantagens financeiras e de conforto destas opções.

9. Conclusão

A sustentabilidade já não é apenas uma tendência passageira no setor imobiliário — é, cada vez mais, uma componente estrutural e estratégica, tanto a nível de políticas públicas como de exigências de mercado e preferências dos consumidores. Em Portugal, a conjugação de medidas de incentivo (fiscais e financeiras), a transposição de diretivas europeias e o maior acesso a informação sobre as consequências das alterações climáticas tornam o imobiliário sustentável uma realidade em franca expansão.

Para promotores, construtoras, gestores de ativos e mediadores imobiliários, apostar na sustentabilidade é apostar na resiliência e na criação de valor a longo prazo. Edifícios energeticamente eficientes, construídos com materiais de baixo impacto ambiental, dotados de sistemas inteligentes de controlo de consumos e, idealmente, certificados por entidades reconhecidas, têm maiores probabilidades de assegurar rendas estáveis, ocupações mais prolongadas e uma mais-valia quando chega o momento de vender ou refinanciar.

Ao adotar as melhores práticas de sustentabilidade, o setor imobiliário contribui para o cumprimento de metas nacionais e europeias de descarbonização, reforça a confiança de investidores e consumidores e gera benefícios para toda a sociedade — reduzindo a pressão sobre recursos naturais, diminuindo os custos de vida e promovendo a inclusão social. Assim, a sustentabilidade não é apenas uma obrigação ética, mas sim um fator de competitividade e de prosperidade sustentável para quem atua neste mercado.

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